um Velho Pervertido

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Esplanadas

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Bebia uma caneca loira e reparei na mesa de madeira da esplanada. A cadeira assemelhava-se a um instrumento de tortura de um consultório médico antigo e era ocupada por uma miúda ruiva.

 

Já fazia bastante tempo que fantasiava, sonhava com esses cabelos e pelos cor de fogo. Dizia-se, na barbearia que frequento, que as ruivas são diferentes. Sentem tudo, cada toque, cada palpitar de veia.

 

As suas pernas eram pálidas e sardentas, e as coxas grossas e cheias, sensuais. Um quadro de Seurat, uma constelação de pontos subindo na palidez da pele. Certamente, era uma miúda de um país distante, mais que não fosse nos costumes e língua.

 

Por breves momentos, há um casal que canta pela rua: ele, com cabelo em cachos, moreno, cabo-verdiano ou algo mais tropical até; a miúda, loira e com as mamas descaídas. Ambos cantarolam com um olhar distante de turistas, um sorriso sem história, apenas surpresa, genuinidade e espontaneidade típica de turistas, sem pressa nem pressão.

 

A rapariga ruiva olha-me como se não o fizesse intencionalmente. Eu sei, meu amor - pensei - também te vejo assim, tímida e curiosa. Gosto quando as mulheres se sentam à minha frente e, assim, sem vergonha, aprecio o cruzar de pernas. Gosto da carne que ondula e origina covas, curvas, ondulações. Esse desejo escondido é animal e carnívoro.

 

Peço um abatanado e tratam-me por senhor. Curioso e desavergonhado, consigo perceber a conversa do casal que se sentou na mesa ao lado da minha.

Gostava que voltássemos às cooperativas - gente burguesa de luxo citadino fala sobre a miséria rural como se de um poema se tratasse - custo zero, diz ela.

 

A minha miúda ruiva levanta-se e o fogo alastra-se pela esplanada, sem que ninguém repare. Apenas eu solto um sorriso como um pássaro enfraquecido, sem esperança. Ela percebe e fulmina-me com um olhar. Não estou na norma, não sigo a moda. O seu traseiro balança enquanto se afasta.

Lisboa, 13 de abril 2023
um Velho Pervertido