Repasto

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Reunimo-nos para jantar em minha casa, estava frio e por isso coloquei alguma lenha na salamandra. Os convidados chegaram à hora marcada e a mesa, preparada ao pormenor, já os aguardava ansiosamente. As senhoras, com longos casacos de inverno cobrindo vestidos de gala pretos, vermelhos, malhados, traziam nos olhos o brilho de quem contempla diamantes. Os cavalheiros, ilustres personagens da nossa praça, haviam-se ostentado dos bigodes e cartolas mais glamorosos que se possam imaginarTodos ansiámos por esta festa durante meses, poucos acreditaram que iria acontecer, pois por motivos óbvios, seria o jantar mais pitoresco que alguma vez se realizou nesta cidade (ou país). A mesa, enorme e coberta por uma toalha branca acolhe as entradas que variam entre carnes frias, pequenos pratos com grelhados de vários tipos, uvas, vinho e pão.

Sentamo-nos e deliciamo-nos com a suavidade da pele virgem marinada que como manteiga se desfaz na boca. As mulheres adoram, uma delas ri e lambe os dedos nunca tentativa de sugar cada resto de inocência virginal da epiderme. Um dos homens, mais bruto e carrascão, diz que lhe sabe a frango, outros dirão que sabe a pato. Eu aprecio particularmente a textura dos pequenos pelos loiros na minha língua que como uma suave lixa massajam deliciosamente as papilas gustativas. As virgens são frutos verdes que assim que desnudas se tornam maduras e sumarentas, tal como nêsperas. No centro da mesa, pequenos seios de mamilos igualmente diminutos fazem as delicias dos homens mais velhos, habituados a couro e a cabedal envelhecido ao sol, relembram a adolescência e as primeiras aventuras carnais. O sabor doce é intenso e portanto é essencial espremer limão, polvilhar com um pouco de manjericão seco e um fio de azeite virgem extra.

As entradas terminam e todos estão bastante satisfeitos, o silêncio que imperava, pois nos deliciávamos com iguarias que impedem conversas de circunstância, dá lugar a um burburinho de elogios:

- Os mamilos eram algo de outro mundo - diz um coronel reformado ainda com o brilho de azeite nos lábios.

- A pele de virgem... hum... nem tenho palavras - comenta uma antiga deputada, agora dedicada a projetos de ajuda humanitária.

Os empregados entram na sala e começam a servir a sopa, um creme de óvulos maduros, o pão, com sementes de sésamo, acompanha perfeitamente a sopa de influências alentejanas, pois os coentros e o alho evidenciam o sabor levemente acre dos ovos. Uma sopa para homens de barba rija. No entanto, até as jovens senhoras ainda na flor da idade riem sem controlo cada vez que, por acidente ou não, trincam um dos óvulos e o seu fluido interno, tal como caviar, excita os palatos. Os homens pedem mais vinho e eu proponho algo diferente. Um vinho à base de sangue de padre abençoado, puro na colheita e envelhecido em pequenos barris de carvalho francês. O vinho é espesso no entanto escorre homogeneamente pelos copos não deixando coágulos ou qualquer outra impureza, o segredo, umas gotas de veneno de serpente que tornam o líquido vital mais fluído.

- Divinal! - exclama um jovem homem, católico e empreendedor na área das novas tecnologias.

Os empregados, carregando longas travessas de prata são recebidos com um júbilo generalizado, pois as generosas coxas de mulher madura, assadas em forno de lenha com castanhas e alecrim perfumam a atmosfera, lembrando as refeições sagradas na altura da Páscoa festejada por católicos.

Fatio um pouco dessa carne na qual a gordura derrete tornando o músculo macio e fácil de mastigar. O calor que me invade a cada dentada dilata-me as pupilas num efeito alucinogénio, na senhora que a meu lado se senta, o efeito é bastante diferente, a cada garfada passa a mão suavemente na vulva, pois a iguaria é deveras excitante e convidativa à masturbação sem pudor, possivelmente um efeito inerente à carne de mulher madura e experiente.

Os homens, com fome de leão, arrancam do osso a carne à dentada num efeito explicito de uma fome de Mulher, uma vontade de Tudo e o sangue quente escorre pelos queixos e os talheres caiem nos pratos, e as mãos ensanguentadas agarram cada naco à medida que este é abocanhado e deglutido, as maças de adão vibram como arcos de violino. Chega a ser extenuante esta mistura de prazer e esforço, as barrigas dos homens incham e os botões das calças rebentam, as senhoras, mais puritanas, utilizam os talheres de prata para cortar pequenos pedaços da carne que à medida que penetram os lábios as vão tornando mais libertas de desejo. Os cabelos que se encontravam presos no alto das cabeças, soltam-se e esvoaçam a cada dentada. Os decotes aumentam de amplitude. A jovem universitária, casada com o velho empresário do papel, massaja os seios e sem vergonha expõe o peito enquanto grita efusivamente:

- Que bom... que bom meu amor...

Nessa noite não chegamos à sobremesa, os corpos nus cobrem as camas dos quartos, as pernas e os sexos fundidos deram lugar à maior orgia vivida nesta casa. Homens e mulheres, mulheres e mulheres, homens e homens, tudo com todos num repasto final inebriados pelo sangue e a carne. Eu, num canto da sala sentado na poltrona onde normalmente escrevo estas histórias, masturbo-me enquanto a filha do eurodeputado é possuída por três homens que a devoravam com um desejo canibal.

Lisboa, 01 de fevereiro 2016
um Velho Pervertido