Mulheres e caudas

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Esperava por elas na esplanada. Ali mesmo perto da Feira da ladra, no Jardim de Santa Clara. A primeira a chegar é Dalila. Apesar de a conhecer desde sempre, sinto que cada vez que a vejo descubro algo novo. Seja um recente cabelo branco que descansa sobre a testa, ou uma opinião descabida sobre um assunto que à partida pensei que estaríamos de acordo. Quando aparece, desliza por entre as mesas da esplanada e os homens olham e cobiçam-na. O vestido provocador, a sua cauda esguia que se movimenta como uma brisa e que a persegue a cada passo, a gota de suor que escorre lentamente como cera derretida pelo largo decote, são detalhes suficientes para engasgar os mirones que bebem cerveja e comem tremoços. Os homens são facilmente conquistáveis por caudas e decotes.

Aguardávamos que a Maria chegasse. Entretanto Dalila contou-me histórias caricatas sobre um daqueles países onde as mulheres são aconselhadas a não exibir a sua cauda. Falou-me do mercado tradicional, daqueles onde tudo se vende e os preços são regateados. As mulheres carregavam grandes sacos de compras e exibiam vestidos com decotes avantajados e tão longos que roçavam o chão. É curioso, quando conhecemos uma mulher e privamos com ela alguns momentos, rapidamente nos apercebemos que a sua cauda não poderia ser de outra forma. As caudas são como impressões digitais. Únicas e pessoais. À medida que me descreve o modo como aquelas mulheres caminhavam pelo mercado, escondendo a cauda por baixo dos vestidos largos e finos noto que Dalila, talvez num ato inconsciente, começa suavemente a roçar a sua própria cauda no braço nu e ao longo das próprias ancas. Uma masturbação involuntária.

Pedimos mais duas cervejas.

- Pois ouve… as mulheres escondem a cauda e só a mostram aos namorados e aos maridos. Aparentemente é algo bastante íntimo. Existem até calças sem abertura para cauda. Consegues imaginar? – diz Dalila ao mesmo tempo que vai bebendo a cerveja e trincando uns tremoços. A sua cauda vibra ao mesmo ritmo que a emoção com que me conta estas deliciosas curiosidades vindas do outro lado do mundo.

- Eu tenho cuidados com a minha cauda – continua Dalila – mas não tenho vergonha em mostra-la, aliás, não deve ser nada confortável andar com ela escondida, presa, censurada!

- Concordo contigo – ao mesmo tempo que me sinto hipnotizado pela ponta da sua cauda que parece perseguir uma mosca invisível. Movimentos circulares e ondulatórios que inebriam qualquer macho mais desprevenido.

Maria está a chegar. Combinou encontrar-se connosco por volta das dezoito horas. São agora dezoito e seis e ela nunca chega atrasada. É quando a vejo em passo acelerado e sorriso rasgado. Os seus olhos são enormes e azuis. Quando passa pelas mesas da esplanada a sua cauda toca nas pessoas que, sentadas, sentem o arrepio de pelo sedoso como um sopro dos deuses. O suave respirar que lhes toca os braços e as faces. Maria é assim… Despistada no que diz respeito à sua sensualidade. É coisa que lhe escorre pelos poros e pelos gestos, no entanto, parece não ser algo que lhe desperte atenção suficiente para a cultivar ao ponto de a poder utilizar em seu favor.

- Desculpem o atraso – diz enquanto se senta. Admiro a agilidade da sua cauda que assume rapidamente a postura de “sensual-despreocupada-não-olhem-para-mim-mas-reparem-como-sou-bela”. A sua cauda é tão felpuda... É daquelas que dá vontade abraçar e adormecer como se de uma almofada se tratasse. Tem um aspeto inocente, quase virginal mas, tanto eu como Dalila (e a própria Maria) sabemos, trata-se apenas de um engodo para os mais desprevenidos. Atraindo os mais incautos, os seus olhos azuis lançam raios perfurantes aos corações dos homens. Pobres imbecis! Os homens são facilmente conquistáveis por caudas e decotes mas são os olhos que matam.

Lisboa, 06 de julho 2016
um Velho Pervertido