Sem título II

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É difícil não ceder à tentação – pensou ele quando numa proposta direta, fria e sem espinhas, ela insinuou que queria por ele ser possuída. O peso sobre os seus ombros fez se sentir quando, no leve movimento de língua, ela saboreou o momento que poderia advir desta nova aventura. Claramente era uma leoa assanhada em fértil período de perversão. Ele por seu lado, rapaz comedido e regrado nos excessos, sentia os calores do nervosismo e ansiedade subirem-lhe pelos ossos. Não que não fosse experiente nas lides da fornicação, no entanto, a ideia e a fantasia são lhe bem mais excitantes que o ato em si. Um sonhador nato. Capaz de idealizar os cenários mais fantásticos e também os mais bizarros. No seu dia-a-dia, as mulheres com as quais se cruza são vítimas deste processo fantasioso e nem desconfiam. A simples aragem que os seus longos cabelos geram ao passar por ele na rua são o suficiente para a sua mente viajar até às cascatas no Gerês e ceder aos ímpetos da natureza!

A predadora faminta incita a lasciva perversão.

- Vamos para uma pensão. A mais suja e mais reles que encontrarmos – dizia-lhe ela ao ouvido enquanto acariciava o seu pescoço. - Anda… Possui-me mesmo aqui, neste banco do jardim. – Tocando-lhe superficialmente sobre as calças.

O falso pudor do dia anterior.

Nada indiciava que por baixo do seu rosto angelical e das suas roupas catolicamente selecionadas vivesse uma mulher com tanta energia sensual e pecaminosa.

- Pensas que sou dessas? Não posso ir para a tua casa. Não te conheço – dizia afastando-se dele num flagrante gesto de puritanismo encapuzado.

Quando penso no modo como nos engalfinhamos na vida uns dos outros mais encantado fico. A individualidade deve ser cultivada. Claro que sim! É nossa obrigação crescer como Pessoa – qualquer relação com o Poeta não é mera coincidência – e apesar dessa obrigatoriedade, bem no cerne do nosso Ser, a procura de uma relação com o nosso semelhante torna-se um ritual caricato (fundamental). A fusão das almas, que advém da união dos corpos e da partilha de momentos íntimos como mijar ou cagar, continua a ser o ritual mais majestoso que a natureza concedeu ao Homem. A condição Humana. Sendo nós seres sociais, insatisfeitos e extremamente apaixonados, torna-nos o bicho mais difícil de domesticar. É quando surgem brigas, arrelias e traições; divórcios e funerais, contas por pagar a terapeutas especializados em dietas, desgostos amorosos e carências sexuais. Lá vamos vivendo a vidinha, a agradável vidinha numa busca interminável restando no final do dia uma questão por responder. É então que sentado no chão frio, encostado a uma parede igualmente gelada, olhando um papel que me informa que existe uma conta por pagar que questiono: - Amor ou dinheiro?

Quando a fantasia termina.

Sai porta fora. Lá vai ele ter com ela na esperança de encontrar uma magia e uma paz com que sonha. O tiro sai pela culatra pois após a queca da ordem e masturbarem-se mutuamente, o fascínio e a novidade desvanece rapidamente, à velocidade da ejaculação.

- Assim matas-me – disse ele sentido o coração tão acelerado que seria capaz de lhe saltar pela goela e ali jazer, entre as pernas dela, perto da vulva ainda latejante e húmida.

Ela respira fundo de olhos fechados e sente as endorfinas percorrerem o corpo; as contrações da vagina, o fluido dele dentro dela que escorre num muco leitoso e o calor que abandona o corpo como um espirito.

Não se voltam a encontrar.

Lisboa, 20 de julho 2016
um Velho Pervertido