Beija flor

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Era um vez um homem. Um homem muito Homem. Vivia sozinho e sem plantas. Nem um alho germinado, pois apodreciam antes de gerar o talo branco e verde - o mesmo acontecia às cebolas. Não era infeliz, apenas Era. Nessa condição de homem muito Homem, vivia um dia depois do outro. Um pouco decadente, assim era visto aos olhos dos outros; os amigos as amigas, a família. O facto de viver esta vida solitária possibilitava-o de se peidar com vontade, de andar nú pela casa - sóbrio ou bêbado - e nem tinha que a limpar se não lhe apetecesse. Por vezes pasmava à janela da sala onde conseguia, ao longe, ver o mar. Mais à esquerda, uma montanha e à entrada do prédio, as crianças ouviam musicas nos telemoveis. Recordou as cabines telefónicas vermelhas, semeadas pela cidade. Outrora eram a única forma de contactar quem quer que fosse, embora tivesse que carregar um pequena agenda com números de telefones.


Este homem era especial. Chamavam-lhe o Beija Flor. Não por ser um doce de pessoa, carinhoso ou romântico. Não por ser respeitoso e cavalheiresco com as mulheres - coisa que era inegável! - mas sim por uma particularidade muito caricata. Havia sido um namorada que o batizou com esse nome. Segundo ela, ele era um mestre do minete. Lambia conas - vulva, pipi, chame-se-lhe o que for mais agradável à Moral - como nenhum outro homem. Lambia com o conhecimento de uma Mulher. Durante a sua vida, as que se foram cruzando com ele - e com a sua língua - derretiam aos prazeres orais de Beija Flor. Começou muito novo, no colégio católico onde estudou as letras e os números. Irene foi a primeira. Eram novinhos demais para perceber o pecado original e tal como haviam visto num livro de anatomia, exploravam os corpos um do outro. As diferenças eram fascinantes. A curiosidade matou gato mas neste caso, a rata. No topo de umas escadas escuras, num pequeno banco de madeira, Irene sentou-se e ele, ajoelhado como que em confissão, lambeu a sua coninha sem pelos. Ela gostou e ele também. Não contaram a ninguém, nem mesmo aos melhores amigos!

Soraia, a namorada que anos mais tarde o baptizou com o nome pelo qual o mundo o conhece, teve bastantes dificuldades em ultrapassar a separação. Eventualmente, como uma sobremesa que adoramos, o sentimento de perda é quase insuportável. O sabor doce no palato e o corpo, viciado, nunca está satisfeito. Soraia chorou baba, ranho e mais lágrimas, lamentações, sentimentos de culpa e raiva. O ciclo normal da mudança. Assim dizem os livros. Seja como for, no âmbito desta história, não interessa. Beija flor desenvolvera os seus dotes estudando a natureza, mais precisamente, desastres naturais ,e desta dessa forma, desenvolveu um conjunto de técnicas infalíveis. Catalogou e nomeou as suas técnicas utilizando nomes tais como: ciclone, tornado, tempestade, granizo. A mais famosa que desenvolveu chama-se Terramoto. Numa simplicidade que nada reflecte a complexidade desta técnica, passo a tentar descreve-la:

A temperatura dos corpos deverá ser aumentada a um nível de quase febre. A húmidade da vulva deverá atingir o ponto rebuçado. Húmida, gotejante como uma pequenina fonte. Este estado de excitação feminino poderá ser alcançado utilizando técnicas como o pequeno tornado - pequenos movimentos circulares em torno do clitóris utilizado apenas a ponta dura e precisa da língua - no entanto, como é sabido, cada mulher tem a sua combinação do cofre, sendo da responsabilidade do mineteiro descodifica-la.

No momento em que a respiração da mulher é quente e ofegante, expressando uma ansiedade de insatisfação, deverá então ser iniciado o Terramoto. A boca e os lábios deverão ajustar-se de forma a simular a posição saxofone - relembro que todos estes termos criados por Beija Flor são de uma complexidade por vezes impossível de descrever - e suavemente encostar na vulva da mulher. A humidade é indispensável para que a sensibilidade seja potenciada. A língua, esse instrumento tantas vezes mal utilizado nas experiências minetárias, deverá trabalhar de forma suave e ponderada. Estimulando - pontualmente - o clitóris. Lentamente o Ohm - característico das sessões de meditação - deverá ser utilizado e tal como sintonizando um rádio, identificar a frequência certa para a mulher em causa. A exploração e experimentação são essenciais para que o climax seja alcançado. Perto do orgasmo, o mineteiro poderá - deverá - expressar um pouco de loucura; a língua provocará o Terramoto em todo o corpo macio e molhado da vulva. A flor que outrora desabrochou ficará pulsante e viva. As almas ficarão leves e suaves nos corpos.

Lisboa, 27 de maio 2017
um Velho Pervertido